segunda-feira, 5 de março de 2012

ASAS DA LOUCURA¹


À noite, lia até bem tarde. O pai, que estudara engenharia em Paris na École Centrale des Arts et Métiers, tinha espalhadas pela casa pilhas de livros em francês, inglês e português. Alberto leu a maioria deles, até mesmo os manuais técnicos. Os livros favoritos eram de ficção científica. Ele gostava da imagem de Júlio Verne de um céu povoado de máquinas voadoras e, aos dez anos, já tinha lido todos os seus romances. Aprendeu nos livros de engenharia do pai que o balão de ar quente fora inventado em 1783, por Joseph e Etienne Montgolfier, fabricantes de papel em Annonay, na França, uma cidade no vale do Ródano, a 64 quilômetros de Lyon.
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EM 1883, Alberto Santos-Dumont, aos dez anos, ainda não vira um balão, mas imitava a invenção dos Montgolfier em miniatura. A partir das ilustrações dos livros, ele fazia pequenos balões de papel e os enchia de ar quente com a chama do fogão.
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Por ter lido Júlio Verne, Alberto estava convencido de que as pessoas já tinham ultrapassado a etapa dos balões de ar quente e haviam voado em aeronaves, também conhecidas como dirigíveis (balões a motor que obedeciam à ação do leme). A família e os amigos tentavam dissuadi-lo dessa idéia. Ele e outras crianças gostavam muito de uma brincadeira. “É um divertimento muito conhecido. As crianças colocam-se em torno de uma mesa e uma delas vai perguntando em voz alta: Pombo voa? ... Galinha voa?... Urubu voa? ... Abelha voa? ... E assim sucessivamente. A cada chamada todos nós devíamos levantar o dedo e responder. Acontecia porém que de quando em quando gritavam: Cachorro voa? ... Raposa voa? ... ou algum disparate semelhante, a fim de nos surpreender. Se algum levantasse o dedo, tinha de pagar uma prenda.

“E meus companheiros não deixavam de piscar o olho e sorrir maliciosamente cada vez que perguntavam: Homem voa? É que no mesmo instante eu erguia o meu dedo bem alto, e respondia: Voa!!! Com entonação de certeza absoluta, e me recusava obstinadamente a pagar prenda.   


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¹ PAUL HOFFMAN. Asas da Loucura: A extraordinária vida de Santos-Dumont. Trad de Marisa Motta. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004

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