Às vezes estamos tão dentro de uma certa realidade que nos esquecemos do quão privilegiados somos. Tendo vindo da realidade de que vim, não tenho direito a esse esquecimento. E por isso quero proclamar que minha vida é um luxo só. Quer luxo maior do que poder comer fora – e bem – todos os dias? Quer luxo maior do que poder comprar – e nem sempre ler – os livros que desejo? Quer luxo maior do que ter um quarto próprio – e mínimo – em pleno plano? Quer luxo maior do que poder abdicar de carro na cidade habitada por uma estranha espécie constituída de cabeça, tronco e rodas? Quer luxo maior do que, à beira dos trinta anos de cárcere laboral, continuar com o riso solto? Quer luxo maior do que ter a mente e o corpo sãos? Quer luxo maior do que ser o equilíbrio em pessoa, digam o que disserem? Quer luxo maior do que, por exemplo, ver um show – e que show! – da grande Rosa Passos? A baixinha (metro e meio, talvez) é uma gigante no talento musical. É uma baixinha de estatura internacional.
Minha vida não tem nada demais, mas é um luxo só. Tenho tudo quanto quero, na exata medida do meu pouco querer. O meu luxo está na simplicidade, no querer menos, no precisar do mínimo. E se quero pouco, se preciso de pouco, o luxo de que falo é só um contentamento íntimo. É um luxo invisível. Onde está escrito que o luxo tem de ser visível? O luxo da ostentação não me interessa. A verdade é que só gosto do luxo que é luxo só pra mim.
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